Nada como uma bela reviravolta para deixar os leitores presos na narrativa e pensando sobre um livro mesmo depois de terminar de ler. É, meu caro, nós nos lembramos bem de obras como Os Outros, Psicose e Gone Girl. A fala “Luke, eu sou seu pai” se tornou tão famosa que até quem não assistiu Star Wars já conhece.
Um enredo que surpreende é um enredo que não é esquecido. E isso serve tanto para bem, quanto para mal. Difícil quem não tenha se surpreendido com o final de How I Met Your Mother. Difícil quem tenha gostado também.
Não basta causar surpresa. Você também precisa convencer o leitor de que o seu enredo faz sentido. De que todos os eventos da história levaram a aquele ponto, e quando a reviravolta acontece, vem o choque, mas também a satisfação.
É esse efeito que vamos ensinar você a alcançar nas dicas de autopublicação de hoje. Aprenda de uma vez por todas como criar reviravoltas no enredo!
O que é a reviravolta?
Uma reviravolta, também conhecida popularmente como um plot twist, é uma subversão de expectativas. Você leva o leitor a acreditar que a história está indo numa direção, apenas para girar o volante para o lado contrário.
Essas surpresas podem ser revelações devastadoras, resultados inesperados ou até mesmo soluções espertas para mistérios ou situações complexas, capazes de formar um verdadeiro quebra-cabeça na mente do público.
O que toda reviravolta tem em comum é a sua relação com o público. Para subverter uma expectativa, essa expectativa precisa existir.
Não existe uma “verdade absoluta” dos enredos que defina que um determinado evento sempre será surpreendente. Em algumas histórias, é comum que personagens morram. Em outras, uma única morte pode ser a maior reviravolta possível.
O que define se um enredo será surpreendente ou não, acima de qualquer outro fator, é a narrativa. São as ideias, expectativas, certezas que você, autor, coloca na cabeça do leitor.
Se você convence o público de que nenhuma personagem morrerá nessa história, mortes serão surpreendentes. Se você convence o público de que as personagens definitivamente vão morrer, então a surpresa está na sobrevivência.
Como criar expectativas para subverter depois
O pulo do gato está em saber como colocar pistas falsas na sua história ou criar uma certa sensação de “segurança” no leitor, apenas para virar tudo ao avesso depois.
Falando assim, parece um manual de como enganar o leitor, não é mesmo? Contudo, você deve ter certa moderação ao buscar esse resultado. Um leitor que se sente muito enganado não é um leitor feliz. Por isso, se você não quiser receber avaliações raivosas após publicar livro é sempre de bom tom colocar pistas verdadeiras também.
Para alcançar um equilíbrio, muitas vezes as pistas falsas estão em maior evidência, enquanto as pistas verdadeiras aparecem escondidas.
Por exemplo, você pode incluir um detalhe que não parece importante, mas que é uma peça fundamental do quebra-cabeça. Ou você pode disfarçar essa pista verdadeira, mostrando-a em um momento em que o leitor estará com a cabeça em outro lugar, como uma cena de ação.
Evite exageros. Se você se esforça demais para convencer um leitor de alguma coisa, pode ser que o resultado seja o contrário. Já estamos cansados de ver o senhor ou a senhora carrancuda, corcunda, com a famosa “cara de bruxa”, mas que na verdade é boazinha.
É importante nos lembrarmos, enquanto criadores de ficção, que o público de nicho costuma ter os olhos treinados. Fãs de mistério costumam tentar desvendá-los enquanto leem. Todo bom leitor já conhece de cor os clichês do seu gênero favorito. Isso é tão bom quanto é ruim.
Por um lado, isso significa que o público já conhece os truques do mágico. Então, não será fácil enganá-los com um recurso batido (como o exemplo da velha carrancuda). Você precisará ser mais criativo para publicar ebook que surpreenda o leitor.
Por outro lado, isso significa que o público já carrega uma série de expectativas pré-existentes, que já estavam ali antes mesmo de você começar a escrever sua história. Se você for numa direção diferente do padrão dos livros do gênero, você já tem chances de surpreender seu leitor.
Exemplos de plot twists
Existem incontáveis reviravoltas famosas nas quais você pode se inspirar ao escrever uma história. Lembre-se, contudo, para que elas continuem sendo reviravoltas, você deve dar seu toque pessoal e fazer com que elas se adequem ao seu enredo.
1. O protagonista estava morto o tempo todo.
Um plot twist que aconteceu em mais de um filme famoso e que mesmo assim ainda surpreende. Quando você acompanha de perto uma personagem, você tende a ser absorvido pelas experiências dela. Muitas vezes não há motivos para você questionar o ângulo que a história toma.
Essa reviravolta pode se dar de mais de uma forma diferente. A forma mais comum é a história envolver fantasmas e, na verdade, o protagonista ser um deles. Mas nem sempre precisa ir por esse lado. A narrativa também pode se passar em um momento posterior à morte da personagem, ou quem sabe até mesmo exista algum tipo de viagem no tempo, na qual a protagonista consiga se comunicar com alguém que vive em uma época que ela já morreu.
São muitas as possibilidades. Divirta-se!
2. O narrador, na verdade, era uma personagem da história.
Talvez essa reviravolta não pareça tão surpreendente assim, fora de contexto. Mas e se a identidade do narrador for um mistério o tempo todo? E se o narrador for uma personagem que o seu leitor jamais imaginaria?
O narrador é, sem dúvidas, um elemento importantíssimo da narrativa. Ele tem o controle sobre como a história é retratada, além de haver a implicação de que, para contar uma história, o narrador-personagem precisa saber dessa história em detalhes.
O narrador pode ser o vilão. Pode ser o protagonista do futuro, após tantas desgraças terem acontecido que ele agora parece ser outra pessoa. Ele pode ser uma personagem coadjuvante, que a princípio não parecia ter importância na história, mas que de alguma forma se envolveu tão intimamente que soube de tudo que aconteceu com os protagonistas.
O que importa é: ele deve ser alguém que o seu leitor não espera, mas que faça todo o sentido.
3. O narrador manipulou a narrativa, a história verdadeira é de outro jeito.
Ainda falando sobre narradores, existe sempre a possibilidade de um narrador-personagem mentir ou manipular a história. Isso deixa toda narrativa muito mais interessante!
Como já mencionamos anteriormente, o leitor tende a confiar na narrativa que lhe é apresentada, pelo simples motivo de que ela é o único contato que ele tem com uma história. Descobrir que tudo aconteceu de forma diferente pode ser um enorme choque.
Essa revelação pode ocorrer de várias formas. Por exemplo, com outra personagem revelando a verdade de forma direta. Também pode ser uma carta, um livro, algum objeto na história que leve a um trecho da narrativa sendo descrito por outra personagem.
A revelação também pode ser gradual, com pequenas pistas no discurso do próprio narrador que indicam que ele não é confiável. Uma ótima forma de identificar mentirosos é quando eles se perdem na própria mentira. O seu leitor pode jogar esse jogo com o narrador, encontrando as inconsistências na sua própria narrativa.
4. O protagonista descobre que é parente de uma personagem importante.
Essa é clássica, de Star Wars até as novelas latino-americanas. Os parentescos podem ser uma receita para o drama em uma história, ainda mais quando eles são segredos bem escondidos.
Para tornar tudo ainda mais dramático, é bom que essa revelação traga total infelicidade para o protagonista. Por exemplo, se ele descobrir que é parente de alguém que odeia, como o vilão, ou alguém que ama demais, como seu interesse amoroso.
No primeiro caso, ele sentirá ressentimento por ter qualquer tipo de conexão com alguém de quem preferiria a distância.
No segundo caso, o contrário se revela: o parentesco o obriga a se afastar de alguém com quem queria maior proximidade. Mais trágico ainda se o romance já estiver consumado, pois ao descobrir o incesto, a tendência é que a personagem seja dominada por uma culpa potencialmente mortal (oh, Édipo).
O parentesco também pode ser impactante por revelar uma traição. Por exemplo, ao descobrir que determinada personagem é sua meia-irmã, fruto de uma relação extraconjugal.
5. Sem querer, ao tentar fazer o bem, o protagonista causou o mal.
Sabe o ditado “de boas intenções o inferno está cheio”? Bem. Às vezes, o protagonista o vive na pele, sem querer. Um herói bem intencionado pode ser um herói mal direcionado.
Pode ser que esse herói seja manipulado por pessoas ruins, e isso pode ocorrer de mil formas diferentes. Talvez ele seja um soldado do governo, que acredita genuinamente que sua missão é a correta, até descobrir que na verdade suas vítimas eram inocentes.
Pode ser que o herói viva uma ilusão elaborada criada pelo vilão, e que todos os seus esforços para impedir que o vilão saia ganhando, na verdade contribuam para que o vilão se fortaleça.
Por outro lado, é possível que o herói não seja manipulado por ninguém. Talvez ele simplesmente tenha as ferramentas erradas, as informações erradas. Ou que, ao tentar salvar a cidade, ele tenha exagerado na força e criado mais caos ainda.
6. O verdadeiro problema era outro, e todos os esforços até agora foram em vão.
Essa reviravolta é um pouco semelhante à anterior, mas não é exatamente a mesma coisa. Aqui, a questão é que o “verdadeiro mal” não era o que o herói pensava, de modo que ele luta uma batalha em vão. Contudo, não é como se as ações do protagonista tivessem necessariamente causado qualquer mal.
Por exemplo, o herói pode achar que derrotou o vilão, apenas para descobrir que o verdadeiro vilão era outra pessoa. O primeiro vilão poderia ser uma fachada, ou apenas uma das várias cabeças da hidra. O herói precisaria, então, se preparar para o próximo desafio.
Em uma pegada de horror cósmico, é possível que o “mal” nem seja um vilão em si, mas um problema que o protagonista deseja solucionar. Por exemplo, a destruição do mundo por um desastre natural. A reviravolta seria descobrir que a verdadeira causa da destruição do mundo é outra, totalmente diferente do que ele imaginava.
E o que fazer? No horror cósmico, não haveria solução. A reviravolta seria o grande choque final da história, percebendo que toda a luta da vida do protagonista foi inútil, que todas as informações que ele levantou estavam erradas, e que nenhum conhecimento que ele adquiriu em toda a sua vida serviriam para impedir esse desastre. O “verdadeiro mal” é maior do que qualquer coisa que está em seu alcance.
Mas, é claro, nem toda história é de horror cósmico. Você também pode escolher que seu protagonista corra contra o tempo para arranjar uma solução para esse novo e enorme problema.
7. Foi tudo um sonho ou uma ilusão.
Essa é mais batida do que saco de pancada, mas ainda pode ser conduzida de forma interessante. O segredo aqui é saber o que não fazer. Não escreva um enredo perfeitamente lógico, estruturado, imersivo e verossímil para depois jogar todo o investimento do seu leitor no lixo falando “foi tudo mentira”.
Se a sua história não passa de um sonho, uma ilusão, uma alucinação, você precisa deixar dicas para o leitor! Entenda que sonhos não costumam fazer muito sentido. Que existem formas de se identificar quando algo não é real.
O que torna essa reviravolta interessante é quando, ao longo da história, você pode traçar uma trajetória que indica que o protagonista não viveu aquilo de verdade.
Essas dicas podem ser como “erros” na Matrix. Coisas que não fazem sentido. Ou você pode indicar que há outra personagem manipulando seu protagonista para que ele viva essa ilusão.
Pode ser até mesmo que o próprio protagonista esteja tentando se libertar desse mundo ilusório, tal qual uma pessoa que quer acordar ou que percebe aos poucos que está sendo manipulada.
8. A desgraça repentina – quando tudo é muito pior do que você jamais imaginou.
Essa reviravolta é do tipo que é feita para chocar o leitor mesmo. Essa reviravolta pode acontecer de duas formas diferentes:
Uma é quando você convence o leitor de que essa é uma história leve e livre de desgraças, para então jogar na cara dele uma tragédia horrível, que o acerta em cheio.
A outra é quando o leitor já sabe que tragédias podem acontecer, mas ele nunca imaginou nada tão bizarramente ruim quanto o que realmente aconteceu.
Obviamente, essa reviravolta é das arriscadas, porque nem todo leitor gosta de ser surpreendido com tragédias horríveis. Mas, se você criar uma situação que faça todo sentido, de modo que aquela desgraça seja uma consequência lógica dos eventos anteriores, por mais sofrida que seja, ela terá um lugar no coração dos leitores.
ALERTA DE SPOILER! Game of Thrones, de certa forma, conseguiu entregar essa reviravolta das duas formas possíveis. Na primeira temporada, você acredita que Ned Stark será o protagonista e que protagonistas têm uma proteção mágica que os impede de morrer. Ao fim da temporada, você percebe que estava errado.
Algumas temporadas depois, já sabendo que a série é cheia de mortes, você ainda se surpreende com o nível de aniquilação geral que foi o Casamento Vermelho. De repente, em um dia de celebração, uma personagem querida e promissora é morta pela traição de um aliado. E ela não morre sozinha. Sua família, seu animal de estimação e seus companheiros são massacrados também.
E aí, autor? O que achou deste artigo?
Ainda existem incontáveis outras possibilidades de reviravoltas, mas se continuássemos listando todas, não pararíamos de escrever nunca! Que tal você nos ajudar então? Comente aqui com a sua reviravolta favorita da ficção.