Foto: Marcello Zambrana/Light Press
Semana que vem, começa a Bienal Internacional do Livro do Rio – que funcionará entre 30 de agosto e 08 de setembro – e a pergunta que está no ar entre os escritores iniciantes é: vale a pena gastar o seu rico dinheirinho para ir ao evento?
A resposta é SIM, mas não pelos motivos que você acredita.
Na Bienal do Rio, assim como na Bienal de São Paulo e em outros eventos maiores, o grande foco é criar um ambiente em que a troca de experiências leitor-escritor favoreça as vendas. Muito dinheiro é gasto pelas editoras em estandes que chamem atenção do leitor ou trazendo escritores best-sellers internacionais. O investimento é vultoso e precisa se pagar. Em resumo, o foco da Bienal do Rio é atrair quem vá comprar livros.
Nesse ambiente, sobra pouco espaço para o escritor iniciante conhecer editores, livreiros e escritores já estabelecidos, e dar o pontapé inicial em sua rede de contatos no mercado editorial. Então, como é que você vai entregar aquele seu original em mãos e finalmente ser lido e, consequentemente, publicado?
Para entender essa resposta, vamos imaginar a seguinte cena:
É o terceiro dia de Bienal. Você é editor de um grande selo editorial e foi escalado para ajudar nas vendas. Como você conhece bem os livros que publica, consegue indicar os livros ideias para os mais diversos gostos. Você já está em pé por seis horas. Faltam mais quatro para terminar o dia. As vendas não estão confortáveis. Se continuar assim, as metas não serão batidas – o que é ainda mais preocupante com a crise. O comercial pede o fôlego de todos. É nesse momento que você percebe que está sendo encarado por uma pessoa. Você tem quase certeza que é um escritor. Outro. O sétimo, hoje. Ele abre a mochila e pega um calhamaço de umas trezentas páginas encadernadas e vem na sua direção.
Será que este ser humano está em condições de prestar atenção na sua história? Será que este é o melhor momento para você entregar o seu original?
Para que não haja qualquer dúvida, eu sou enfático em te dizer que NÃO.
Bienal não é lugar para entregar originais, nem book proposals. Faça melhor, nem o leve para a Bienal. No máximo, entregue um marcador de páginas. Se, por um acaso, aparecer uma oportunidade de apresentar a sua obra, converse com o editor, pegue seu contato e a envie depois.
Desanimou?
Besteira, não desanime. Ainda que você não tenha resultados imediatos na Bienal, isso não é um sinal ruim. A carreira do escritor é uma construída no longo prazo. Devagar e sempre. É uma maratona e é fundamental que você não queria correr uma prova de cem metros rasos.
Em uma maratona, a companhia faz toda a diferença. Na Bienal, você vai ter a oportunidade de quebrar o isolamento, tão característico do nosso ofício, e conhecer quem está tentando matar o mesmo dragão que você. Com um pouco de sorte, você poderá fazer amigos que te acompanharão nos melhores e piores momentos da sua carreira.
Eu conheci dois dos meus melhores amigos – e meus dois primeiros amigos escritores – em eventos literários. O Felipe Sali, na própria Bienal do Rio, e a Bruna Ceotto, na primeira edição da Flipop. De lá para cá, fiz mais alguns grandes amigos e foram incontáveis conversas e chopes que contribuíram muito para a minha carreira e para a minha vida.
Será que estou romantizando a importância dos amigos escritores? Eu acho que não.
Se compararmos o mercado editorial com outros, perceberemos que ele é lento e pouco transparente. Em resumo, você terá sorte se conseguir obter um e-mail de rejeição em seis meses. Foi rápido e você teve uma resposta.
Mas eu gostaria de dividir uma experiência recente. Há algum tempo, eu entreguei um original na mesa de um editor. Ele se disse ansioso para ler o meu novo romance. Minhas expectativas foram parar na Lua. O retorno veio 15 meses depois. Um e-mail onde o editor me conta que não teve (e nem terá) tempo de ler.
Nesse cenário pouco auspicioso, onde nem e-mails não são lidos, você precisa de gente que esteja disposta a dividir com você o pouco de informação que tem. Além disso, você precisa aprender a lidar com a frustração. Sozinho, as decepções vão acumular. Você vai pensar em desistir até decidir desistir.
É com esse clima adverso, como o que enfrentamos, que a Universidade de Harvard prefere receber seus estudantes. A instituição exige tudo dos seus alunos. É tanto conteúdo e rigor que os alunos caem no desespero logo nas primeiras aulas. Da desolação coletiva, nasce um senso de unidade quase que instantâneo. Todos eles estão no mesmo barco tentando vencer a faculdade. Eles precisam colaborar para não sucumbir. Exatamente como nós escritores diante desse mercado: precisamos nos unir.
Quando eu cheguei no meu fundo do poço, quando a pilha de decepções ficou grande demais, quando eu decidi desistir da minha carreira literária, foi a força dada pelos meus amigos, principalmente a Bruna e o Felipe que me fizeram dar mais uma chance à escrita.
Se eu estivesse desistido naquele momento, muita coisa boa não teria acontecido comigo. Este ano, que tem sido incrível, não existiria.
Veja você! Apesar do trabalho duro de tantos anos. Do incremento gradual e visível na minha carreira. Do prêmio e da publicação. Eu teria desistido sem a ajuda dos meus amigos escritores.
Então, não tente vencer o mercado editorial sozinho. Aproveite a Bienal do Rio – e os outros eventos literários – para conhecer seus colegas escritores e fazer alguns amigos.
Bruno Crispim nasceu em Niterói-RJ. Apaixonado por ficção, comportamento humano e finanças, transitou, por muito tempo, nessas áreas. Até seu ano sabático, quando morou no Canadá. Aproveitou o inverno congelante para escrever O Segundo Caçador. Um esforço que rendeu frutos. O romance foi vencedor do III Prêmio UFES de Literatura e publicado. De volta ao Brasil, ganhou destaque no Wattpad com GUIA do Escritor de Ficção e foi convidado para participar da oficina de escrita criativa do premiado autor Marcelino Freire. Recentemente, finalizou seu segundo romance Morte e Ascensão de Darla Abranches, participou da coletânea Realidades Alternativas – de melhores contos da revista Superinteressante (Ed. Abril) e estreou o GUIA do Escritor de Ficção no Instagram, onde produz conteúdos para relacionados a escrita criativa e dicas para autores.
Sobre Morte e Ascensão de Darla Abranches: o lançamento de Bruno Crispim é um romance policial que conta a história de Miguel, um médium desacreditado que está prestes a ser despejado. Desesperado, vê no obituário da jovem Darla Abranches uma mensagem divina e a oportunidade de ganhar um dinheiro e pagar seu aluguel. Sua missão é descobrir a verdade sobre a morte da jovem e guiar o espírito de Darla em sua Ascenção.
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Ótimas dicas!! Muito bom saber que ainda tem chance depois de todas as decepções que o mundo literário nos oferece.
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Verdade Rosangela, não desista!