Livros de aventura: como escrever uma viagem fantástica

Existem muitos livros consagrados que envolvem o protagonista partindo em uma jornada. Essas histórias atravessam diversos gêneros, do biográfico até a fantasia. O que todos têm em comum? A capacidade de transportar você, leitor, pelos cenários magníficos.

No entanto, nem todo autor se adapta bem a todo esse negócio de descrever uma viagem. Como fazer um leitor sentir que essa personagem está passando por territórios diferentes sem estar lá para ver?

Às vezes, pode parecer mais fácil só pular etapas: pronto, fulana chegou no destino, agora vamos para o enredo. É claro que essa técnica pode funcionar em algumas histórias. Nem sempre o caminho é o mais importante… Mas será mesmo que isso cola quando você promete uma grande jornada ao seu leitor? Não minta para si mesmo. Você sabe a resposta.

Se você quer publicar livro sobre uma viagem inesquecível, é hora de arregaçar as mangas e aprender como criar ambientações tão palpáveis que o seu leitor se sentirá o próprio viajante.

A dica de autopublicação de hoje não se resume a como construir um ambiente para a sua história, e sim vários. Cada um com suas características únicas, com transições sensíveis entre um território e outro, promovendo um senso de progressão na jornada.

Que tipo de livro precisa descrever uma viagem em detalhes?

Antes de mais nada, é sempre importante definir do que se trata a sua história para compreender do que ela necessita. O passo primordial é ser capaz de montar uma simples sinopse.

Traremos dois exemplos clássicos, porém muito diferentes entre si: O Hobbit, de J.R.R. Tolkien, e On The Road: Pé na Estrada, de Jack Kerouac.

O Hobbit conta a história de Bilbo Bolseiro, um Hobbit pacato e satisfeito cuja vida vira de cabeça para baixo quando ele se junta ao mago Gandalf e a treze anões em sua jornada para reaver um tesouro roubado.”  – Fonte: Livraria da Travessa

“O livro [On The Road] relata a viagem pelos Estados Unidos de carro, por Sal Paradise e Dean Moriarty, repleta de sexo, drogas, álcool e liberdade.” – Fonte: Wikipédia

Enquanto O Hobbit se trata de uma história de fantasia em um universo ficcional, On The Road é um livro mais “pé no chão”, por assim dizer. Mas além das diferenças de gênero e universo, um ponto pivotal que separa os dois livros são as motivações de seus protagonistas.

O Hobbit segue o clássico modelo da Jornada do Herói. O protagonista vive uma vida pacata até que recebe o chamado para a aventura. Ele reluta, mas parte nessa jornada por saber que é o escolhido. O caminho é cheio de obstáculos, mas ele tem um objetivo definido, de importância objetiva.

On The Road, por sua vez, tem um formato mais livre. Mais fluído. A jornada não é para um lugar, ou por alguma coisa em específico. A jornada existe pela jornada. A viagem se faz valer. O que o protagonista deseja é a experiência.

E sabe o que ambos livros têm em comum? O poder transformativo da viagem em si. O quanto você pode aprender com o próprio caminho. Nem tudo é sobre a linha de chegada.

Se você buscar a sinopse de On The Road nas livrarias, encontrará um texto bem diferente:

“Responsável por uma das maiores revoluções culturais do século XX, On The Road – pé na estrada volta às livrarias (…) mantendo intacta sua aura de transgressão, lirismo e loucura.

Como o gemido lancinante e dolorido de Uivo, de Allen Ginsberg, o brado irreverente e drogado de Almoço nu, de William Burroughs, ou a lírica emocionada e emocionante de Lawrence Ferlinghetti, On The Road escancarou ao mundo o lado sombrio do sonho americano. A partir da trip de dois jovens – Sal Paradise e Dean Moriarty –, de Paterson, New Jersey, até a costa oeste dos Estados Unidos, atravessando literalmente o país inteiro a partir da lendária Rota 66, Jack Kerouac inaugura uma nova forma de narrar.

A obra-prima de Kerouac foi escrita fundindo ação, emoção, sonho, reflexão e ambiente. Nesta nova literatura, o autor procurou captar a sonoridade das ruas, das planícies e das estradas americanas para criar um livro que transformaria milhares de cabeças, influenciando definitivamente todos os movimentos de vanguarda, do be bop ao rock, o pop, os hippies, o movimento punk e tudo o mais que sacudiu a arte e o comportamento da juventude na segunda metade do século XX.” – Fonte: Livraria da Travessa

Muito mais do que falar sobre o enredo do livro, se prioriza descrever o impacto de vivenciar a aventura junto com esses “heróis”. Jack Kerouac proporcionou uma experiência narrativa tão vívida e lancinante que foi capaz de revolucionar uma geração inteira, que ganhou até nome: a geração beat.

Mas e você com isso? Bem, além das recomendações de livros, caso não os tenha lido ainda, fica o questionamento: quais as motivações do seu protagonista? Por que ele partiu nessa jornada? E o resto se constrói a partir daí.

Para determinadas histórias, a linha de chegada realmente é o que importa. A viagem pode ser feita de forma rápida, viajando de avião ou até mesmo por um portal direto para o destino onde o enredo se desenrola. Nada de atravessar chão, cruzar águas ou subir montanhas. As fronteiras não importam.

Outras histórias podem optar por pular essa parte mais trabalhosa do trajeto simplesmente porque uma viagem de avião ainda é uma viagem. Mas, nesse caso, para fazer a viagem parecer uma viagem, é importante mostrar como o lugar onde a personagem está agora não é onde ela esteve antes.

Há ainda as histórias que começam como a Jornada do Herói, mas na qual o protagonista vai percebendo ao longo da jornada que o seu objetivo inicial não é o que realmente importava. Ou que aquilo que parecia ser pelo bem maior, não era o certo a se fazer. Ou, ao menos, que não era o certo para ele.

Em casos como esse, surge novamente a necessidade de descrever tudo, passo a passo.

A jornada por diferentes cenários e culturas

Para tornar vívida a sensação da jornada, é preciso criar diferenças. De um ponto a outro do globo, você sentirá diferenças no clima, na vegetação, nos animais locais, na arquitetura, na culinária, na linguagem, no jeito que as pessoas se vestem e se portam, nas crenças e superstições… Até mesmo o tempo é diferente!

Não se trata só do fuso-horário. Em alguns lugares do mundo, você pode ver o sol à meia-noite. E em outras épocas, não ver a luz do dia em horário nenhum. São diferenças incríveis, fantásticas, mas também brutais. Se adaptar a realidades extremas pode ser mais difícil do que aparenta.

E existem as semelhanças também. O acolhimento. A delícia de ver que há algo em comum entre os seres humanos em qualquer lugar do mundo. Que é possível dançar uma música sem entender sua letra, sem reconhecer sua batida. Que existem mil formas diferentes e deliciosas de se preparar um prato de arroz.

Para publicar ebook que retrata essas diferenças, podemos começar pelo básico. Uma lógica simples é que em ambientes próximos, haverão mais semelhanças do que diferenças, e por aí vai. Logo, o clima, a vegetação, a fauna e por aí vai entre duas cidades vizinhas provavelmente não será tão diferente assim.

Essas diferenças naturais tendem a crescer gradativamente, ou quando há um fator relevante que causa grande mudança. Por exemplo, se houver uma montanha muito alta, é provável que a temperatura fique mais baixa quanto mais próximo do pico. Já um vale rodeado por montes pode ser bastante quente e abafado.

Quando pensamos historicamente, era muito comum que fronteiras fossem estabelecidas onde houvesse um elemento natural que dificultasse a travessia. Por exemplo: desertos, rios, montanhas.

As razões são óbvias. Esses terrenos por si só representam uma barreira pela dificuldade em sua travessia. Não só isso cria uma separação natural entre quem está de um lado e quem está do outro, como dificulta uma tentativa de invasão.

Para melhorar, são elementos de fácil identificação. Como se delimita uma linha imaginária ao redor de um território? Você pode tentar construir uma cerca ou um muro. Você pode colocar uma placa na estrada. Pode colocar guardas monitorando. Mas tudo isso envolve esforço e, quanto maior o território, maior o esforço.  

Contudo, em um contexto mais “primitivo”, por assim dizer, basta olhar para um certo rio ou montanha e pensar “ah, é aqui que começa tal território”.

Em uma narrativa, é muito mais interessante que a personagem possa identificar essas fronteiras da forma mais natural possível. Uma placa dizendo “bem-vindo à nossa cidade” pode ter valor simbólico, como um presságio, mas ela não diz muito sobre a jornada em si.

Todos os elementos que mencionamos acima podem ser explorados de forma interessante. Em O Hobbit, acompanhamos Bilbo atravessando uma floresta tenebrosa. Em On The Road, Sal e Dean atravessam nuvens de insetos e suportam o calor extremo, muitas vezes sem ter um teto onde poderiam dormir.

Um exemplo notável de ambientação é o jogo The Last of Us, que se passa vinte anos após a explosão de um apocalipse zumbi. Os protagonistas Joel e Ellie precisam atravessar as ruínas do país para chegar à sede de uma organização rebelde que busca a cura para a mutação zumbi.

O cenário é uma mistura de ruínas e natureza. A civilização se divide em territórios controlados por militares, territórios controlados por facções independentes e “terras de ninguém”. Com recursos escassos e a possibilidade constante de mutação, é difícil saber em quem confiar.

O jogo explora barreiras físicas, como estradas, muros, grades, e também barreiras monitoradas por pessoas armadas: sejam facções independentes ou o exército. Se você pisar em falso, pode ser atacado por zumbis ou humanos desconfiados.

E, em diversos momentos, é possível respirar na companhia da sua companheira de viagem. Em meio a todo o caos, você pode parar e olhar a paisagem, tomada pela natureza. Pode entrar em uma casa abandonada, e encontrar vestígios da família que viveu ali um dia.

Lembre-se que, para além das dificuldades naturais, há também a intervenção humana. Estradas com pedágio, locais com grande índice de criminalidade, comunidades que são hostis contra invasores, fronteiras com barreiras monitoradas.

Muitas vezes um viajante é sujeito a um “julgamento” que decide se ele pode ou não entrar no território. Para isso existem vistos, passaportes, barreiras alfandegárias.

E é assim, detalhe por detalhe, que se constrói uma grande jornada. Está pronto para embarcar nessa?

Leia também:

2 Comentários


  1. Olá pessoal da Bibliomundi, saudades de vocês…
    .
    .
    Obrigada por compartilhar OS ARTIGOS, são incríveis. Este último que li a respeito de como escrever uma viagem, para mim foi de grande relevância. Já está me ajudando muito a desenvolver um pouco mais na escrita do meu livro.

    Responder
    1. Redação

      Esperamos ver seu livro logo logo publicado em nossa plataforma, Eliana!

      Responder

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *