Folclore brasileiro na literatura

Todo país tem o seu folclore, e o brasileiro é imensamente rico. O termo, derivado do inglês “folk lore”, se refere a todo tipo de sabedoria popular. Desde crenças, causos, superstições até a música, dança, brincadeiras, roupas e expressões artísticas variadas. Contudo, quando falamos em folclore, o que vem mesmo à cabeça são os mitos típicos de uma região.

Nosso Brasil é enorme e diverso. Foi lar originário de diversos povos indígenas, e também sofreu forte colonização. Em cada canto, encontramos características únicas, crendices regionais. De certa forma, é possível dizer que não temos apenas uma cultura, mas sim culturas no plural. O folclore brasileiro abraça toda essa diversidade em um só.

A narrativa oral transmitiu causos de uma geração para outra, sempre aumentando um ponto. Cada região com uma versão ligeiramente diferente, algumas superstições mais fortes ali do que aqui. Conhecemos o lobisomem dos gringos, mas também conhecemos o lobisomem tupiniquim, que é o primeiro filho homem após sete filhas mulheres e sai após a meia-noite transformado em besta fera.

Temos o boto cor-de-rosa, o boitatá, o curupira, o saci pererê, a cuca, o mapinguari, a pisadeira, o negrinho do pastoreio, o corpo seco, a mula-sem-cabeça, a mãe d’água, entre tantos outros que fica até difícil de se lembrar. Talvez você até conheça todos, mas já parou para pensar em quantas pessoas não são tão letradas assim no folclore brasileiro? Para a maioria de nós, o contato com essas lendas acontece apenas na escola, por meio de livros infantis educativos.

Conforme nos afastamos da oralidade e das crendices, a tradição dá lugar ao novo e, infelizmente, o nacional dá lugar ao estrangeiro. Pode-se dizer que o público em geral não pestaneja em consumir obras de ficção inspiradas em mitos eurocêntricos, mas quando se trata do que vem daqui, nada parece bom o suficiente.

No cenário independente brasileiro, existem algumas iniciativas criativas que valorizam o nosso folclore. Por exemplo, indie games que se inspiram nas nossas lendas para criar um cenário mítico, no mesmo modelo que jogos gringos inspirados na mitologia nórdica e afins. Esses jogos apresentam o nosso folclore sob uma nova lente, não mais ilustrados no estilo dos livros infantis, mas com um appeal adulto, com a mesma seriedade que qualquer outra obra teria.

É o caso de Guerreiros Folclóricos, um projeto multimídia com jogo e ebook, no qual a realidade é dividida em dois mundos: a Terra, onde habitamos, e Akakor, o mundo das lendas. Nesta história, Saci é o rei de Akakor e lidera um plano de invasão da Terra, pois considera os humanos indignos de sua posse. O protagonista é o lendário guerreiro indígena Kambaí, que viaja para Akakor a fim de livrar o reino do controle do terrível Saci.

É interessante observar como as criaturas míticas do nosso folclore são representadas em Guerreiros Folclóricos. O jogo, que conta com design 3D de ponta, apresenta bestas aterrorizantes com características correspondentes às descrições das lendas, mas muito diferentes do que imaginávamos quando crianças.

Obras de ficção independentes que privilegiam o folclore brasileiro nos inspiram a questionar como enxergamos a nossa própria cultura, e o quanto conhecemos nossas próprias histórias. Nos lembram do quão horripilantes são mitos como o da pisadeira e da mula-sem-cabeça, nos fazem imaginar o quão longe um boto cor-de-rosa é capaz de chegar na sua manipulação. E, é claro, podem ressignificar o próprio saci pererê, transformando-o de uma figura sapeca em uma personalidade imponente.

O folclore nos dá a oportunidade de explorar a ancestralidade e, ao mesmo tempo, reimaginá-la sob novos moldes, novas experiências. Podemos voltar para as raízes nativas do país e contar histórias de guerreiros indígenas pré-colonização, mas também podemos publicar ebook de ficção que se passa na contemporaneidade, com enredos que entrelaçam nossas vivências e o nosso imaginário folclórico.

Na Bibliomundi, contamos com alguns ebooks nesses moldes, como Dos Tempos do Bisavô – Histórias Que Não Se Ouvem Mais. Um livro de não ficção que aborda ancestralidade, causos e tradições como principal tema, revivendo os deleites do passado e trazendo de volta essas experiências para as próximas gerações. Não mais por meio da narrativa oral, mas por meio do ebook.

O autor, Joacir Pezente, conta as histórias e causos do octogenário Seu Mané Cruz e seu afilhado Josino. Uma vida simples do interior, a fazenda como cenário. O narrador um homem simples e sábio. É uma narrativa que privilegia uma experiência brasileira autêntica, mas em muito esquecida. Um enredo fantástico e, ao mesmo tempo, humilde. Um senhor praticamente anônimo, mas cujas histórias são tão interessantes (ou até mais) do que as contadas por uma estrela de Hollywood.

A autopublicação de ebooks permite que qualquer pessoa com acesso a internet possa publicar livro, mas sabemos que não é todo brasileiro que terá essa iniciativa. São pessoas como você que podem dar voz aos Seus Mané Cruz desse Brasil. Você pode ressignificar os mitos. Reviver as tradições.

E, é claro, isso pode ser feito não só com livros de não ficção para adultos, mas também com livros de romance histórico, livros de fantasia, livros Young Adult e os inesquecíveis ebooks de literatura infantil, que marcam o primeiro contato das novas gerações com o folclore e criam um laço contínuo entre o futuro e a ancestralidade.

E aí, autor? Já pensou em publicar um livro de folclore?

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