Escrevendo comédias românticas no mundo atual

As comédias românticas são um clássico. Extremamente populares entre os anos 90 e 2000, é difícil quem não tenha crescido nessas décadas acompanhado de filmes como 10 Coisas Que Eu Odeio em Você (1999) e Uma Linda Mulher (1990).

Agora, estamos virando uma nova página, tanto no cinema quanto na autopublicação de livros. Depois de uma certa queda na produção de comédias românticas por volta da década de 2010, o gênero está em voga mais uma vez com títulos como Para Todos os Garotos Que Já Amei (2018) e Com Amor, Simon (2018).

Como todas as tendências cíclicas, às vezes basta um “descanso” para voltarmos a apreciar o que por um tempo se tornou batido e cafona. E, é claro, nada como uma certa reviravolta para revitalizar os clássicos. Para os românticos inabaláveis, agora é um ótimo momento para publicar ebook de comédia romântica.

Essa pausa na febre das comédias românticas tem seus sintomas, causas, consequências:

  • Primeiro, significa que talvez a popularidade do gênero tenha sido tão intensa que todo mundo cansou por um tempo. Não é o fim, só uma pausa para descansar.
  • Segundo, pode indicar uma mudança na mentalidade, talvez os temas clássicos das comédias românticas já não funcionassem mais para o séc. XXI. Ou seja, foi preciso repensar a comédia romântica.
  • O terceiro movimento é uma resposta ao passado: tiramos nossa soneca, estamos revigorados e cheios de ideias novas e atuais. A comédia romântica volta, os clichês que funcionam são mantidos, o que é ofensivo é deixado para trás e características únicas da nossa época são introduzidas na ficção.

É interessante mencionar que uma forma de responder às tendências é a sátira. Contudo, para a sátira funcionar, é preciso estabelecer uma conversa, o contexto tem que estar claro para a audiência.

Quando as comédias românticas começaram a ficar repetitivas e o público começou a criticar o gênero, as sátiras faziam sentido. Depois que a comédia romântica foi colocada na gaveta, essa comunicação foi cortada. Existe uma nova geração que nasceu nos anos 2000 e nem sequer acompanhou as referências dos anos 90. Não faz sentido fazer uma sátira de algo que foi feito há mais de vinte anos atrás.

A volta da comédia romântica deve ser feita de modo sincero, de coração aberto. Ela deve trazer o que sempre procuramos no gênero: felicidade, conforto, alegria, esperança e talvez uma boa dose de escapismo.

A comédia romântica nos faz acreditar no amor, desejar a felicidade, nos torna capazes de rir dos nossos próprios erros e buscar segundas chances. Em tempos difíceis, ela é um acalento.

O que mudou nas comédias românticas?

É muito comum assistirmos séries e filmes feitos há um bom tempo atrás e pensarmos “eita, isso não é tão legal quanto eu lembrava”. Inclusive, é muito comum que o motivo para pensarmos isso seja o fato de que essas obras de ficção são bem mais ofensivas do que estamos acostumados atualmente.

Tudo é um produto do seu tempo. Progredimos em termos de representatividade de minorias e também temos uma visão diferente do que é politicamente correto, do que é adequado de se reproduzir na ficção. Até mesmo no dia a dia, mudamos aos poucos o nosso vocabulário e o que achamos engraçado.

É claro, nem todo mundo fica satisfeito com esse policiamento. Mas é fato, o tempo passa e a mentalidade muda. Não se trata só de mudanças conscientes, mas de uma tendência natural a conhecer outras realidades que se fortalece em especial nas gerações mais novas.

Por esse motivo, cada vez mais é rentável para grandes produtoras fazer filmes com protagonismo de grupos que antes não ganhavam o holofote. No mundo dos super heróis, a Marvel alcançou enorme sucesso de bilheteria com Pantera Negra (2018), Capitã Marvel (2019) e agora Shang-Chi e a Lenda dos Dez Anéis (2021).

Não é diferente quando se trata de comédias românticas. Para Todos os Garotos Que Já Amei é protagonizado por uma jovem asiático-americana. Com Amor, Simon é uma história de amor entre dois garotos.

A verdade é que existe um enorme público que quer se enxergar em personagens ficcionais e foi privado disso por tempo demais. Pessoas não brancas, LGBT+, com corpos fora do padrão e neurodiversas também merecem viver seus contos de fadas modernos.

E indo mais longe, quando você muda a cara das personagens, é como se todos os clichês do gênero também ganhassem uma cara nova. Todas aquelas narrativas que já foram usadas e abusadas por protagonistas padrão ainda são escassas quando se trata de grupos minoritários.

Portanto, essa é a hora de publicar livro com uma protagonista gorda que não seja ridicularizada, nem entre no papel obrigatório da mulher insegura e infeliz. Que ela possa ser linda e amada como é, que tenha características que vão além do seu tipo físico e que o enredo abuse de clichês alegres.

Que tal uma história com todo um círculo de personagens LGBT+? Há quem diga que é um “exagero” ter mais de uma personagem não-hétero por história. Pois saiba que na vida real, a comunidade queer se atrai como ímãs, desde a época da escola formando laços de amizade e solidariedade. Então não há nada de irreal ou estranho nisso, okay?

Talvez para você, esses grupos pareçam escondidos, invisíveis. Talvez você não possa dizer que tem amigos de um determinado grupo. Contudo, o seu ciclo de amizades não determina toda a realidade do mundo. Se você expandir sua visão e começar a circular por outros ambientes, é capaz de conhecer narrativas ricas que jamais imaginou.

É hora também de recusar perspectivas retrógradas de como alguém deve viver sua vida. O caminho para a felicidade é diferente para cada um, e isso é belíssimo.

Sua protagonista é uma profissional de sucesso? Ótimo! Que ela jamais seja obrigada a escolher entre o amor ou a sua carreira. Que ela possa viver a maternidade de forma plena, caso opte por isso, sem ser retratada como negligente por também ter um trabalho fora de casa.

O interesse amoroso não precisa “resgatar” sua personagem principal de uma vida de solteira. Uma comédia romântica pode celebrar o amor romântico sem fazer com que ele pareça a única forma existente de ser feliz e pleno enquanto um ser humano adulto.

De certa forma, a comédia romântica pode até mesmo celebrar outras formas de se amar. Ela pode ser uma celebração da amizade, da família, das paixões individuais.

É interessante, sim, que essas personagens se complementem e se ajudem, mas sem que essa ajuda seja uma “salvação da solteirice”. Que tal se, em vez disso, esse romance representasse uma forma de redescobrir a si mesmo, de ganhar a força e a motivação para ser uma pessoa melhor, mais corajosa, mais consciente?

Uma comédia-romântica arrebatadora ainda precisa ter uma trajetória com conflitos e desencontros. São elas que criam a tensão necessária para tudo ficar mais emocionante. E, é claro, com bom humor podemos tirar muitas risadas dessas pedras no meio do caminho.

Talvez a resposta seja uma pergunta: o que você quer ler em uma comédia romântica que não foi escrita ainda?

O seu melhor enredo pode estar esperando você ao virar a esquina.

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