Disparidade no reconhecimento das mulheres no meio editorial

Semana passada, no primeiro artigo do mês das mulheres da Bibliomundi, falamos sobre a suposta “literatura feminina”. Como a produção literária das mulheres é sempre colocada em uma caixinha, como essas autoras são vistas pelo mundo primeiro como mulheres e depois como escritoras.

O tratamento de homens e mulheres no mercado editorial não é igualitário. É óbvio, não é de esperar nada muito diferente de um mercado inserido em uma sociedade machista. Contudo, às vezes esperamos que ao menos em nossa bolha a realidade seja um pouco diferente.

Nos esportes, uma das principais desculpas para a disparidade no tratamento das competições femininas é a falta de público. Nem mesmo esse argumento, por mais frágil que seja, poderia ser usado em relação às mulheres na literatura. Segundo pesquisa divulgada pelo Instituto Pró-Livro (2012), 57% dos leitores brasileiros são mulheres.

Se tantas mulheres leem livros e tantas mulheres publicam livros, por que tão poucos livros escritos por mulheres recebem críticas positivas e destaque na mídia? Por que tão poucas autoras mulheres são premiadas?

Em toda a história do prêmio Nobel da Literatura, 87,7% dos premiados foram homens. A escritora sueca Selma Lagerlöf, no ano de 1909, foi a primeira mulher a ser premiada, e desde então foram quase duas décadas até que outra mulher, Grazia Deledda, ganhasse o prêmio em 1926. Somente em 1993 Toni Morrison, uma escritora negra, foi premiada.

Se tratando de revistas literárias e jornais de destaque, dos 1366 livros avaliados pela The Times Literary Supplement (TLS) em 2010, apenas 330 foram escritos por mulheres. É uma diferença abismal.

Para entender o que está por trás desses números, trazemos… mais números. Se 75% dos livros avaliados pela TLS foram escritos por homens, 72% dos críticos literários que escreveram essas avaliações eram homens.

Em suma, o que observamos são grandes revistas literárias que contratam muito mais críticos homens do que mulheres e, por sua vez, esses homens escrevem muito mais sobre autores homens do que autoras mulheres. Um ciclo de desigualdade.

Essa situação não ocorre exclusivamente na TLS. Segundo dados levantados pela iniciativa VIDA Count referentes ao ano de 2018, publicações como The New York Review of Books, The Atlantic, London Review of Books, The Threepenny Review e muitas outras têm uma maioria de redatores homens.

O argumento utilizado pelos editores dessas publicações também não varia muito. Supostamente, há esforços para contratar mais mulheres que façam críticas literárias, mas é mais comum que homens se voluntariem para o cargo. A questão é: até que ponto esses esforços são verdadeiros?

A tendência é que padrões se repitam, e o machismo estrutural está aí para garantir isso. O simples fato de haver tão poucas redatoras mulheres publicando seus textos em revistas literárias já é desencorajador. E, uma vez que essas mulheres se apresentem e tentem publicar suas críticas e resenhas, não é nada incomum que esses textos sejam previamente julgados pelos editores da mesma forma que os livros de autoras mulheres. Se quem escreveu é mulher, o texto é “feminino”. Se é “feminino”, é inferior.

Entenda, não é apenas necessário que mais mulheres tenham oportunidade de emprego no mercado editorial. O buraco é mais embaixo: é preciso desconstruir como um todo a noção de inferioridade agregada ao trabalho da mulher. Dessa forma, todas as escritoras mulheres terão mais oportunidades, sejam as que escrevem livros, sejam as que escrevem resenhas.

Tal disparidade estatística impulsiona cada vez mais movimentos de priorização do trabalho feito por mulheres e grupos minoritários em geral, como foi o caso da hashtag #ReadWomen2014, criada pela escritora e ilustradora Joanna Walsh. O objetivo era propor a leitura de autoras mulheres e a hashtag passou por publicações que iam desde “gritos de guerra” até celebrações das conquistas das mulheres e, é claro, recomendações literárias.

Apesar dos pesares, existem melhorias, ainda que lentas. A publicação London Review of Books, por exemplo, apresentou um aumento de 6,8% na quantidade de redatoras mulheres entre 2017 e 2018. E, embora ainda sejam minoria, existem publicações relevantes, como a Tin House, nas quais a maioria dos críticos literários são mulheres.

Se até os anos 80 era comum que se passassem décadas inteiras sem que uma mulher sequer ganhasse o Nobel da Literatura, a partir dos anos 90 essa estatística começou a mudar, se estabilizando em 70% dos laureados sendo homens. Ainda está longe de ser ideal, mas não deixa de ser uma mudança.

Precisamos pensar em meios de abrir espaço para mulheres que escrevem. Seja oferecendo oportunidades para essas escritoras, seja recomendando e divulgando sua produção escrita, seja simplesmente lendo os seus textos.

Mulheres, a Bibliomundi é de todos para todos. Esperamos ver cada vez mais ebooks escritos por vocês em nossa plataforma de autopublicação!

Publicar livro não precisa ser um sonho distante. Acreditamos em você. Acreditamos nas nossas autoras, que cada vez mais conquistam espaço e sempre marcam presença nos nossos destaques como best-sellers.

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