A figura do espião nos acompanha desde a infância. Difícil quem não tenha ouvido falar de personagens clássicos como James Bond e, para quem assistia TV Globinho, também tinham as Três Espiãs Demais com seus equipamentos fashion.
Sem mais, essa figura tão misteriosa e distante das nossas realidades está presente no nosso imaginário em todas as faixas etárias, com personagens em todos os estilos.
Publicar livro de espionagem, no entanto, pode parecer uma aventura colossal. Ao mesmo tempo que nosso imaginário é bombardeado com ícones da cultura pop, pouco sabemos sobre a realidade do trabalho de espião, e é preciso se debruçar em pesquisa para poder escrever uma história que seja realista e convincente.
Por isso, nas dicas de autopublicação de hoje, vamos destacar alguns elementos fundamentais para escrever um ótimo romance de espionagem.
Entenda o gênero para escrever o livro
A figura do espião pode estar presente em qualquer tipo de enredo, isso não necessariamente classifica um livro como uma história de espionagem. Antes de mais nada, é preciso que o enredo gire em torno do trabalho do espião em si. Em geral, o arco narrativo cobre uma missão de alta importância.
Os livros de espionagem são mais comumente associados aos gênero de suspense e ação, sendo a espionagem uma subcategoria. Com um enredo centrado em uma missão de alta importância e, consequentemente, altos riscos e consequências, a expectativa é que o leitor vivencie a adrenalina através da narrativa.
Em outras palavras, a narrativa de suspense e espionagem deve alimentar no leitor a sensação de que o protagonista pode ser descoberto e capturado a qualquer momento, que a missão possa dar errado, que existam consequências graves para qualquer erro cometido.
O aspecto da ação também é relevante. Leitores ávidos de livros de espionagem tendem a esperar que o livro seja rico em cenas vívidas que poderiam ser adaptadas facilmente para um filme de ação. Se quer saber como, basta assistir 007.
É sempre bom ressaltar que você não é obrigado a publicar ebook de espionagem que se encaixe perfeitamente nessas categorias. Como mencionamos no primeiro parágrafo, uma história de espionagem pode até mesmo ser um desenho animado sobre três patricinhas que estão no ensino médio e são recrutadas por uma agência de inteligência.
No entanto, a partir do momento que você já tem uma certa visão de como você quer que seja a sua história, é interessante que você entenda onde ela se encaixa em termos de gênero. Dessa forma, você não decepcionará os leitores com uma categorização incorreta nos catálogos de livros e também poderá fazer uma boa pesquisa de campo conhecendo melhor o gênero de interesse.
Lembre-se que é preciso conhecer as regras para quebrá-las. Se você quiser escrever um romance de espionagem que foge da caixinha, pelo menos tenha uma boa noção de quais são as características típicas e estrutura narrativa padrão do nicho (considerando, inclusive, seu alinhamento com os gêneros de ação e suspense).
Se você já tem uma boa noção do gênero, podemos partir para o passo a passo:
1. Crie uma premissa inovadora
Obviamente, para escrever uma história você precisa de uma premissa. O que queremos incentivar é que você vá longe. Em geral, romances de espionagem se inspiram em eventos da vida real, mas isso não impede que você use sua criatividade.
É interessante focar em uma área de interesse mais específica. Escolha um determinado período histórico, país, agência, conflito internacional. Entenda onde a sua história se situa e crie uma “missão impossível”.
Quanto mais complicada e relevante a missão, mais o leitor tende a se envolver. Contudo, certos sensacionalismos e clichês já se repetiram tanto que a história perde o fator surpresa, o suspense, a adrenalina. É aí que entra a inovação.
Busque um ângulo novo, surpreendente. Não tenha medo de explorar a ambiguidade moral. Escolhas difíceis são interessantes, assim como protagonistas-vilões.
2. Pesquise e aprenda sobre espionagem como realmente é
Criatividade é importante, mas verossimilhança é fundamental. Sua imaginação pode correr solta, desde que você consiga apresentar uma narrativa convincente para o seu público. Para alcançar esse objetivo, o caminho é pesquisar e pesquisar.
Não basta apenas consumir muito conteúdo do gênero. Você deve entender sobre espionagem como acontece na vida real. Quais equipamentos e tecnologias são utilizados, em qual período histórico foram introduzidos, que tipo de técnica é utilizada e quais agências utilizam qual técnica.
Leia relatos e reportagens, busque o máximo de fontes confiáveis que você conseguir. É interessante também procurar pontos de vista variados, considerando que espionagem e política andam juntas. Ou seja, se a sua história é relacionada ao conflito entre dois países, busque canais de notícias de ambos.
Feita a pesquisa, cabe a você aliar essas informações reais aos aspectos imaginativos. Lembre-se que você não está escrevendo um livro técnico, e sim uma obra de ficção. A sua pesquisa serve como base para a ação.
Se você quiser saber mais sobre o processo de pesquisa, dê uma olhada no nosso artigo Por que é importante pesquisar antes de escrever um livro.
3. Construa uma personagem convincente
Ironicamente, a espionagem é um nicho com grande destaque para a personagem. Enquanto o protagonista se camufla e executa missões confidenciais, o leitor o acompanha intimamente, com acesso aos seus passos e pensamentos.
O protagonista do romance de espionagem deve ser alguém apto para a profissão: inteligente, prático, adaptável, leal, disciplinado, resiliente e com uma capacidade fora do comum de separar a vida pessoal da profissional, disfarçar suas emoções, esconder suas opiniões e não chamar atenção para si.
Enquanto essa personagem pode ter características impressionantes que se expressam na execução de missões difíceis, ela deve ser capaz de exteriorizar um semblante comum. Inclusive, uma pessoa sem atributos físicos excepcionais é ótima para esse papel.
Muitas vezes, tendemos a apostar num protagonista que se destaca em tudo, e existem espiões icônicos da cultura pop que são assim (novamente, pense James Bond). Contudo, se você quer apostar no ângulo da verossimilhança, talvez esse não seja o ideal.
Seja o seu protagonista um mestre dos disfarces ou apenas uma pessoa capaz de “desaparecer” na multidão, lembre-se que o mundo é diverso e que os espiões devem representar essa diversidade. Existem mil tipos de pessoas, seu espião pode ter que se passar por qualquer um deles. As possibilidades existem. Explore-as.
4. Não se esqueça dos conflitos internos e externos
Nada como um conflito para desenvolver uma narrativa. Os conflitos são capazes de impulsionar quase todos os elementos de um livro: enredo, atmosfera, personagens, entre outros.
No entanto, ao falar de conflito, é bom separá-lo em duas categorias: interno e externo. O conflito interno se trata de um dilema que deve ser resolvido pela personagem através da tomada de decisão. O conflito externo, por sua vez, é impulsionado por fatores que estão fora de seu controle, por exemplo, representando o confronto entre duas facções opostas.
Embora sejam categorias distintas, um tipo de conflito pode impulsionar o outro. Por exemplo, uma ameaça à segurança nacional representa um conflito externo. Contudo, a escolha de uma solução para essa ameaça representa um conflito interno. Indo mais longe, caso o protagonista não consiga tomar uma decisão a tempo ou escolha o caminho errado, a resolução desse conflito interno pode desencadear um novo conflito externo.
Essa interrelação entre um conflito e outro é apenas uma das formas que o conflito impulsiona uma narrativa, movendo o enredo adiante e escalando cada vez mais a tensão. Precisamos falar também sobre como o conflito contribui para o desenvolvimento de personagens.
A verdade é que quando uma pessoa é colocada numa situação difícil, ela se revela. Não no sentido de revelar a sua identidade de espião para os inimigos, mas de revelar para o leitor (e talvez até para si mesma) o seu verdadeiro caráter, suas verdadeiras capacidades.
Por isso, você não deve ter medo de explorar conflitos realmente difíceis, sejam internos ou externos. Dilemas morais são mais do que bem-vindos no nicho da espionagem. Questões atemporais podem ser visitadas:
- Será que os fins justificam os meios? Se sim, existe um limite?
- Será que eu defendo a causa certa?
- É certo matar uma pessoa inocente para salvar cem?
- Sou capaz de sacrificar minhas relações pessoais pelo bem maior?
- E se eu me afeiçoar a uma pessoa do lado inimigo?
O trabalho de um espião não é simples. A forma que a sua personagem reage a essas dificuldades é o que a define e amadurece.
5. Use e abuse de recursos narrativos
Por fim, mas não menos importante, use e abuse de técnicas narrativas feitas para prender o leitor. Reviravoltas no enredo, foreshadowing, pistas falsas, ironia dramática, cliffhangers. Use tudo isso. Lembre-se que o público leitor de espionagem quer suspense, adrenalina, ação, drama, dilema, política.
Desenvolver um enredo complexo e uma boa personagem principal são fatores relevantes, mas a prosa ainda é a corrente que carrega o leitor. Use palavras descritivas nas cenas de ação, explore a moralidade ambígua das escolhas difíceis, dramatize a intriga, aprenda como criar suspense em uma história.
É isso que o romance de espionagem quer e precisa.
E aí, autor? Está pronto para embarcar nessa missão?